sábado, 12 de dezembro de 2009

My Handicap

Michael Bierut




All of us start with youthful dreams. But sooner or later you realize that you've turned into something different than what you imagined.

I always wanted to be a designer. I learned early on that being a designer involved, among other things, affecting a manner of dress, speech and general attitude that would signal to other designers that you shared their access to the creative muses. At the same time, these same cues would enable non-designers to dimly apprehend that there was something special about you that commanded a certain level of respect and even awe.

To be honest, I was never much good at this even when I was in my twenties, and now that I'm about to cross over into my second half-century on earth, I may as well admit defeat. I'm not special. I look, talk, and act exactly like a million other middle-aged, upper-middle-class, balding, white, suburban businessmen.

But there is one difference. I don't golf.


I've come to know a little bit about demographics, customer profiling and market segmentation, and I can tell I'm supposed to care deeply about golf. As befitting my station in life, I spend a lot of time in airports, and there I'm besieged with pictures of golfers. Occasionally these images actually promote a particular golf course or golf-related product, but more commonly golf is used as a metaphor, usually for business success. The key card I was entrusted with by the Crowne Plaza Hotel on a recent layover at LAX is a good example. The photograph on it shows two men standing side by side on, I think, a putting green. One, wearing an odd apron-type-thing that I'm guessing identifies him as a caddy, examines something in his hand. The other, gripping a club, stands alertly at his side. Beneath this, some type: PHILOSOPHY work together. After a great deal of study, I noted that the first four letters of "philosophy" are bolder than the others. Could this mean something? A visit to Google ("phil+crowne+plaza") and, aha: it turns out that the guy with the club must be someone named Phil Mickelson, pro golfer and Crowne Plaza spokesman. A profoundly rich tapestry of layered codes, all intended to predispose me to the comforts of the Crowne Plaza, all completely lost on me.

Lest you get concerned, although I've never heard of Mr. Mickelson, even I know the most famous golfer in the world, Tiger Woods. If you spend any time in airports or paging through business magazines, you quickly realize that Woods is assumed to be a surefire aspirational figure for guys like me. He's everywhere. His endorsement contracts are legion, including sports-related brands like Nike, Gatorade, and Titleist, and general consumer companies like General Motors, American Express, TAG Heuer, and Gillette.

For me, the most inescapable expression of Woods's authority is the one deployed since 2003 by management consultant Accenture in their "Be A Tiger" campaign, which links photographs of the golfer in action with abstractions like Distractions, Focus, and Hindsight. "As perhaps the world's ultimate symbol of high performance, he serves as a metaphor for our commitment to helping companies become high-performance businesses," Accenture says on its website. "Informed by findings from our comprehensive study of over 500 high performers, as well as our unparalleled experience, the advertising draws upon our understanding of the world's elite companies, and our ability to channel that knowledge on behalf of our clients." The tantalizing element here is that reference to those "500 high performers," carefully selected by Accenture for their passionate commitment to both business success and Tiger Woods, an opinion-shaping elite that obviously excludes — by a long shot — me.

It's no secret that golf and business success are inextricably linked. The Wall Street Journal, itself a stronghold of golf columns, golf metaphors and golf advertising, ran a widely-reprinted story last year titled "Business Golf Changes Course." "Business golf is a collusion that has developed over the years between business people and their clients," according to the WSJ. The old model, "foursomes of cigar-chomping white males closing deals at exclusive country clubs" has given way to today's business golfers, who claim that "the sport's primary value is to get away from an office environment to network and build relationships, in the hopes of doing deals down the road."

Apparently, there is a small industry of consultants who stand at the ready to provide remedial assistance to people like me. These include a former KPMG marketing exec, Hilary Bruggen Fordwich, who "gives seminars at companies and one-on-one lessons to lobbyists and other executives on organizing golf retreats, avoiding business golf blunders and deciding when best to broach the business topic." Broaching the business topic — yikes! Indeed, every time I lose a potential project to one of the big identity consultancies, I always end up muttering the same thing: their goddamned new business team must have taken them golfing. Yes, while I'm sitting on my butt worrying about letterspacing, other people are out on the links, broaching things.

The sad thing about all this is that golf is, or should be, in my blood. My late father was a passionate golfer, playing once or twice a week at public courses in northeastern Ohio like Seneca and Briarwood. And he was good. Shooting a hole-in-one gets your name in the back of Golf Digest, and he did it not once, but twice. My brother Don is a serious golfer today.

But I'm not. A good part of my job is helping clients imagine how they could reach specific audiences most effectively. This means, too often, reducing people to stereotypes. As my father's son, being a non-golfer may be a last vestige of adolescent rebellion. Or it may be a denial that I've turned into a stereotype that I never chose. Or it may even be a way of resisting aging and, ultimately, death. No matter what, it is my handicap.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A função cultural das privadas

RUBEM ALVES

Sabedoria é deixar o sufoco das 10 mil coisas não essenciais e focalizar os olhos na única coisa que é essencial

"EM TEMPOS DIFÍCEIS , em algumas pessoas crescem asas; outras compram muletas."
Quando vivi nos EUA, me informaram de uma revista científica que só publicava palpites não comprovados ainda por meio de pesquisas. A diferença entre artigos já provados e palpites é simples. Artigos já provados enunciam conclusões, chegadas, descansos. Palpites anunciam partidas, caminhadas, canseira...
Sugestões de adesivos para colocar em carros: "Você tem direitos; procure sempre um advogado"; "Você tem avessos; procure sempre um psicanalista..."; "Sem advogado não se faz justiça..."; "Os advogados, se quiserem, podem contribuir para a realização da justiça...".
Jay W. Forrester, professor de administração do MIT, enunciou a seguinte lei das organizações: "Em situações complicadas, esforços para melhorar as coisas frequentemente tendem a torná-las piores, algumas vezes muito piores e, ocasionalmente, calamitosas". Essa lei foi enunciada há 2.000 anos de forma mais simples e poética, que todos podem compreender: "Não se costura remendo de tecido novo em roupa podre. Porque o remendo de tecido novo rasga o tecido podre e o buraco fica maior do que antes" (Jesus).
O livro sagrado do taoísmo, o "Tao-Te-Ching", diz que estamos constantemente divididos: de um lado, a tentação de 10 mil coisas que demandam ação. Todas não essenciais. Do outro lado está uma única coisa: o essencial, raiz das 10 mil perturbações. Sabedoria é deixar o sufoco das 10 mil coisas não essenciais e focalizar os olhos na única coisa que é essencial.
"Paraíso" -jardim- é uma palavra que deriva do grego "paradeisos", que, por sua vez, vem do antigo persa "pairidaeza", que quer dizer "espaço fechado". Jardim é um espaço fechado. Por que fechado? Para ser protegido. Para que seja nosso.
Fora dos muros que fecham o jardim está o espaço selvagem, ainda não moldado pelo desejo de vida e beleza que mora nos seres humanos.
Política é a arte de criar esse espaço.
Política é a arte da jardinagem aplicada ao espaço público. Deixando de lado as 10 mil coisas a serem feitas, a missão das prefeitas e dos prefeitos é criar esse espaço necessário para que a vida e a convivência humana possam acontecer. Tudo o mais é acessório. Não ficou claro? Explico.
Mais importante que cem fechaduras é a única chave que as abre...
Já pensaram que, mais importante que as 10 mil coisas administrativas que podem ser feitas, a tarefa essencial é fazer o povo pensar? Que o essencial é educar? O Diabo sugeriu que Jesus tomasse providências práticas imediatas para resolver o problema: "Ordena que essas pedras se transformem em pães...". Jesus respondeu que o que realmente importava eram as palavras...
"Sonho que se sonha só é só um sonho. Sonho que se sonha junto é realidade." (Raul Seixas) É preciso que o espaço-jardim da cidade exista primeiro na cabeça das pessoas para se tornar realidade. É o essencial.
Escrevi, faz tempo, uma crônica com o título "A função cultural das privadas". Conversando sobre o assunto com uma amiga, tivemos uma ideia luminosa: e se as empresas passarem a colocar, na porta diante dos tronos, trechos literários curtos, para serem lidos pelos intelectuais assentados? Muitas experiências de iluminação científica surgiram em momentos de solidão meditativa.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Texto de Ayn Rand mostrando a inviabilidade de uma sociedade baseada no princípios marxistas


"De cada um, conforme sua capacidade, para cada um, conforme sua necessidade".Karl Marx


O trecho é longo -- é parte de Atlas Shrugged (1957; em Português: Quem é John Galt? [Editora Expressão e Cultura, 1987]), romance em que Ayn Rand conta, entre outras coisas, como uma fábrica de ponta e extremamente produtiva é destruída por idéias igualitárias. A transcrição é segundo o texto da tradução (pp. 510-517).

A maior parte do trecho é uma explicação, por parte de um ex-empregado, e dada a uma mulher que o entrevistava, de porque a fábrica faliu. Ironicamente, a fábrica se chamava Motores Século Vinte (Twentieth-Century Motors).

Trata-se de uma obra de ficção - ma non troppo. . . O livro foi recentemente votado pelos leitores, na Internet, a obra de ficção mais importante do século XX.



Bem, foi uma coisa que aconteceu na fábrica onde eu trabalhei durante vinte anos. Foi quando o velho morreu e os herdeiros tomaram conta. Eles eram três, dois filhos e uma filha, e inventaram um novo plano para administrar a fábrica. Deixaram a gente votar, também, para aceitar ou não o plano, e todo mundo, quase todo mundo, votou a favor. A gente não sabia, pensava que fosse bom. Não, também não é bem isso, não. A gente pensavam que queriam que a gente achasse que era bom. O plano era o seguinte: cada um trabalhava conforme sua capacidade, e recebia conforme sua necessidade. . . .

Aprovamos o tal plano numa grande assembléia: nós éramos seis mil, todo mundo que trabalhava na fábrica. Os herdeiros do velho Starnes fizeram uns discursos compridos, e ninguém entendeu muito bem, mas ninguém fez nenhuma pergunta. Ninguém sabia como plano ia funcionar, mas cada um achava que o outro sabia. E quem tinha dúvida se sentia culpado e não dizia nada, porque do jeito como os herdeiros falavam, quem fosse contra era desumano e assassino de criancinha. Disseram que esse plano ia concretizar um nobre ideal. Como é que a gente podia saber? Não era isso que a gente ouvia a vida inteira dos pais, professores e pastores, em todos os jornais, filmes e discursos políticos? Não diziam sempre que isso é que era certo e justo? Bem, pode ser que a gente tenha alguma desculpa para o que fez naquela assembléia. O fato é que votamos a favor do plano, e o que aconteceu conosco depois foi merecido.

A senhora sabe, nós que trabalhamos lá na Século Vinte durante aqueles quatro anos, somos homens marcados. O que é que dizem que o inferno é? O mal, o mal puro, nu, absoluto, não é? Pois foi isso que a gente viu e ajudou a fazer, e acho que todos nós estamos malditos, e talvez nunca mais vamos ter perdão. . .

A senhora quer saber como funcionou o tal plano, e o que aconteceu com as pessoas? É como derramar água dentro de um tanque onde tem um cano no fundo puxando mais água do que entra, e cada balde que a senhora derrama lá dentro o cano alarga mais um bocado, e quanto mais a senhor trabalha, mais exigem da senhora, e no final a senhora está despejando balde quarenta horas por semana, depois quarenta e oito, depois cinqüenta e seis, para o jantar do vizinho, para a operação da mulher dele, para o sarampo do filho dele, para a cadeira de rodas da mãe dele, para a camisa do tio dele, para a escola do sobrinho dele, para o bebê do vizinho, para o bebê que ainda vai nascer, para todo mundo à sua volta, tudo é para eles, desde as fraldas até as dentaduras, e só o trabalho é seu, trabalhar da hora em que o sol nasce até escurecer, mês após mês, ano após ano, ganhando só suor, o prazer só deles, durante toda a sua vida, sem descansar, sem esperança, sem fim. . . .

De cada um, conforme sua capacidade, para cada um, conforme sua necessidade. . . .

Nós somos uma grande família, todo mundo, é o que nos diziam, estamos todos [p.511] no mesmo barco. Mas não é todo mundo que passa dez horas com um maçarico na mão, nem todo mundo que fica com dor de barriga ao mesmo tempo. Capacidade de quem? Necessidade de quem, quem tem prioridade? Quando é tudo uma coisa só, ninguém pode dizer quais são as suas necessidades, não é? Senão qualquer um pode dizer que necessita de um iate, e se só o que conta são os sentimentos dele, ele acaba até provando que tem razão. Por que não? Se eu só tenho o direito de ter carro depois que eu trabalhei tanto que fui parar no hospital, depois de garantir um carro para todo vagabundo e todo selvagem nu do mundo, por que ele não pode exigir de mim um iate também, se eu ainda tenho capacidade de trabalhar? Não pode? Então ele não pode exigir que eu tome meu café sem leite até ele conseguir pintar a sala de visitas dele? . . .

Pois é. . . . Mas aí decidiram que ninguém tinha direito de julgar suas próprias capacidades e necessidades. Tudo era resolvido na base da votação. Sim, senhora, tudo era votado em assembléia duas vezes por ano. Não tinha outro jeito, não é? E a senhora imagina o que acontecia nessas assembléias? Bastou a primeira para a gente descobrir que todo mundo tinha virado mendigo -- mendigos, esfarrapados, humilhados, todos nós, porque nenhum homem podia dizer que fazia jus a seu salário, não tinha direitos nem fazia jus a nada, não era dono de seu trabalho, o trabalho pertencia à 'família', e ele não lhe devia nada em troca, a única coisa que cada um tinha era a sua 'necessidade', e aí tinha que pedir em público que atendessem às suas necessidades, como qualquer parasita, enumerando todos os seus problemas, até os remendos na calça e os resfriados da esposa, na esperança de que a 'família' lhe jogasse uma esmola. O jeito era chorar miséria, porque era a sua miséria, e não o seu trabalho, que agora era a moeda corrente de lá.

Assim, a coisa virou um concurso de misérias disputado por seis mil pedintes, cada um chorando mais miséria que o outro. Não tinha outro jeito, não é? A senhora imagina o que aconteceu, que tipo de homem ficava calado, com vergonha, e que tipo de homem levava a melhor?

Mas tem mais. Mais uma coisa que a gente descobriu na mesma assembléia. A produção da fábrica tinha caído quarenta por cento naquele primeiro semestre, e aí concluiu-se que alguém não tinha usado toda a sua 'capacidade'. Quem? Como descobrir? A 'família' decidia isso no voto, também. Escolhiam no voto quais eram os melhores trabalhadores, e esses eram condenados a trabalhar mais, fazer hora extra todas as noites durante os próximos seis meses. E sem ganhar nada mais, porque a gente ganhava não por tempo nem por trabalho, e sim conforme a necessidade.

Será necessário explicar o que aconteceu depois disso? Explicar que tipo de criaturas nós fomos virando, nós que antes éramos seres humanos? Começamos a esconder toda a nossa capacidade, trabalhar mais devagar, ficar de olho para ter certeza de que a gente não trabalhava mais depressa nem melhor do que o colega ao nosso lado. Tinha que ser assim, pois a gente sabia que quem desse o melhor de si para a 'família' não ganhava elogio nem recompensa, mas castigo. Sabíamos que para cada imbecil que estragasse um motor e desse um prejuízo para a fábrica -- ou por desleixo, porque ele não tinha nenhum motivo para caprichar, ou por pura incompetência -- quem ia ter que pagar era a gente, trabalhando de noite e no domingo. Assim, a gente se esforçava o máximo para ser o pior possível.

Havia um garoto que começou todo empolgado com o nobre ideal, um garoto muito vivo, sem instrução, mas um crânio. No primeiro ano ele inventou um processo que economizava milhares de homens-hora. Deu de mão beijada a descoberta dele para a 'família', não pediu nada em troca, nem podia, mas não se incomodava com isso. Era tudo pelo ideal, dizia ele. Mas quando foi eleito um dos mais capazes e condenado a trabalhar de noite, ele fechou a boca e o cérebro. No ano seguinte, é claro, não teve nenhuma idéia brilhante.

A vida inteira nos ensinaram que os lucros e a competição tinham um efeito nefasto, que era terrível um competir com o outro para ver quem era melhor, não é? Nefasto? Pois deviam ver o que acontecia quando um competia com o outro para ver quem era o pior.

Não há maneira melhor de destruir um homem do que obrigá-lo a tentar NÃO fazer o melhor de que é capaz, a se esforçar por fazer o pior possível, dia após dia. Isso mata mais [p.512] depressa do que a bebida, a vadiagem, a vida de crime. Mas para nós a única saída era fingir incompetência. A única acusação que temíamos era a de que tínhamos capacidade. A capacidade era como uma hipoteca que não se termina de pagar.

E trabalhar para quê? A gente sabia que o mínimo para a sobrevivência era dado a todo mundo, quer trabalhasse quer não, a chamada 'ajuda de custo para moradia e alimentação', e mais do que isso não se tinha como ganhar, por mais que se esforçasse. Não se podia ter certeza de que seria possível comprar uma muda de roupas no ano seguinte -- a senhora podia ou não ganhar uma 'ajuda de custo para vestimentas', dependendo de quantas pessoas quebrassem a perna, precisassem ser operadas, ou tivessem mais filhos. E se não havia dinheiro para todo mundo comprar roupas, então a senhora também ficava sem roupa nova.

Havia um homem que tinha passado a vida toda trabalhando até não poder mais, porque queria que seu filho fizesse faculdade. Pois bem, o garoto terminou o secundário no segundo ano de vigência do plano, mas a 'família' não quis dar ao homem uma 'ajuda de custo' para pagar a faculdade do filho. Disseram que o filho só ia poder entrar para a faculdade quando houvesse dinheiro para os filhos de todos entrarem para a faculdade -- e, para isso, era preciso primeiro pagar a escola secundária dos filhos de todos, e não havia dinheiro nem para isso. O homem morreu no ano seguinte, numa briga de faca num bar, uma briga sem motivo; brigas desse tipo estavam se tornando cada vez mais comum entre nós.

Havia um sujeito mais velho, um viúvo sem família, que tinha um hobby: colecionar discos. Acho que era a única coisa de que ele gostava na vida. Antigamente, ele costumava ficar sem almoçar para ter dinheiro para comprar mais um disco clássico. Pois não lhe deram nenhuma 'ajuda de custo' para comprar discos -- disseram que aquilo era 'luxo pessoal'. Mas, naquela mesma assembléia, votaram a favor de dar para uma tal de Millie Bush, filha de alguém, uma garotinha de oito anos, feia e má, um aparelho de ouro para corrigir seus dentes -- isto era uma 'necessidade médica', porque o psicólogo da empresa disse que a coitadinha ia ficar com complexo de inferioridade se seus dentes não fossem endireitados. O velho que gostava de música passou a beber. Chegou a um ponto em que nunca mais era visto sóbrio. Mas parece que uma coisa ele nunca esqueceu. Uma noite, ele vinha cambaleando pela rua quando viu a tal da Millie Bush: deu-lhe um soco que lhe quebrou todos os dentes. Todos.

A bebida, naturalmente, era a solução para a qual todos nós apelávamos, uns mais, outros menos. Não me pergunte onde é que achávamos dinheiro para isso. Quando todos os prazeres decentes são proibidos, sempre se dá um jeito de gozar os prazeres que não prestam. Ninguém arromba mercearias à noite nem rouba o colega para comprar discos clássicos nem caniços de pesca, mas se é para tomar um porre e esquecer, faz-se de tudo. Caniços de pesca? Armas para caçar? Máquinas fotográficas? Hobbies? Não havia 'ajuda de custo de entretenimento' para ninguém. O 'entretenimento' foi a primeira coisa que eles cortaram. Pois a gente não deve ter vergonha de reclamar quando alguém pede para abrirmos mão de uma coisa que nos dá prazer? Até mesmo a nossa 'ajuda de custo de fumo' foi racionada a ponto de só recebermos dois maços de cigarro por mês -- e isso, diziam eles, porque o dinheiro estava indo para o fundo do leite dos bebês.

Os bebês eram o único produto que havia em quantidades cada vez maiores -- porque as pessoas não tinham outra coisa para fazer, imagino, e porque não tinham que se preocupar com os gastos da criação dos bebês, já que eram uma responsabilidade da 'família'. Aliás, a melhor maneira de conseguir um aumento e poder ficar mais folgado por uns tempos era ganhar uma 'ajuda de custo para bebês' -- ou isso ou arranjar uma doença séria.

Não demorou muito para a gente entender como a coisa funcionava. Todo aquele que resolvia fazer tudo certinho tinha que se abster de tudo. Tinha que perder toda a vontade de gozar qualquer prazer, não gostar de fumar um cigarro nem mascar um chiclete, porque alguém podia ter uma necessidade maior do dinheiro gasto naquele cigarro ou chiclete. Sentia vergonha cada vez que engolia uma garfada de comida, pensando em quem tinha tido que trabalhar de noite para [p.513] pagar aquela garfada, sabendo que a comida que comia não era sua por direito, sentindo a vontade infame de ser trapaceado ao invés de trapacear, ser um pato e não um sanguessuga. Não podia ajudar os pais, para não colocar um fardo mais pesado sobre os ombros da 'família'. Além disso, se ele tivesse um mínimo de senso de responsabilidade, não podia nem casar nem ter filhos, pois não podia planejar nada, prometer nada, contar com nada.

Mas os indolentes e irresponsáveis se deram bem. Arranjaram filhos, seduziram moças, trouxeram todos os parentes imprestáveis que tinham, todas as irmãs solteiras grávidas, para receber uma 'ajuda de custo de doença', inventaram todas as doenças possíveis, sem que os médicos pudessem provar a fraude, estragaram suas roupas, seus móveis, suas casas -- pois não era a 'família' que estava pagando? Descobriram muito mais 'necessidades' do que os outros -- desenvolveram um talento especial para isso, a única capacidade que demonstraram.

Deus me livre! A senhora entende? Compreendemos que nos tinham dado uma lei, uma lei MORAL, segundo eles, que punia aqueles que a observavam -- pelo fato de a observarem. Quanto mais a senhora tentava seguir essa lei, mais a senhora sofria; quanto mais a senhora a violava, mais lucrava. A sua honestidade era como um instrumento nas mãos da desonestidade do próximo. Os honestos pagavam, e os desonestos lucravam. Os honestos perdiam, os desonestos, ganhavam. Com esse tipo de padrão do que é certo e errado, por quanto tempo os homens poderiam permanecer honestos? No começo éramos pessoas bem honestas, e só havia uns poucos aproveitadores. Éramos competentes, orgulhávamo-nos do nosso trabalho, e éramos empregados da melhor fábrica do país, para a qual o velho Starnes só contratava a nata dos trabalhadores. Um ano depois da implantação do plano não havia mais um homem honesto entre nós. Era ISSO o mal, o horror infernal que os pregadores usavam para assustar os fiéis, mas que a gente nunca imaginava ver em vida.

A questão não foi que o plano estimulasse uns poucos corruptos, e sim que ele corrompia pessoas honestas, e o efeito não podia ser outro -- e era isso que chamavam de idéia moral!

Queriam que trabalhássemos em nome de quê? Do amor pelos nossos irmãos? Que irmãos? Os parasitas, os sanguessugas que víamos ao redor? E se eles eram desonestos ou se eram incompetentes, se não tinham vontade ou não tinham capacidade de trabalhar -- que diferença fazia para nós? Se estávamos presos para o resto da vida àquele nível de incompetência, fosse verdadeiro ou fingido, por quanto tempo nos daríamos o trabalho de seguir em frente? Não tínhamos como saber qual era a verdadeira capacidade deles, não tínhamos como controlar suas necessidades -- só sabíamos que éramos burros de carga lutando às cegas num lugar que era meio hospital, meio curral -- um lugar onde só incentivavam a incompetência, as catástrofes, as doenças - burros de carga que só serviam às necessidades que os outros afirmavam ter.

Amor fraternal? Foi aí que aprendemos, pela primeira vez na vida, a odiar nossos irmãos. Começamos a odiá-los por cada refeição que faziam, cada pequeno prazer que gozavam, a camisa nova de um, o chapéu da esposa do outro, o passeio que um dava com a família, a reforma que o outro fazia na sua casa -- tudo aquilo era tirado de nós, era pago pelas nossas privações, nossa renúncias, nossa fome.

Um começou a espionar o outro, cada um tentando flagrar o outro em alguma mentira sobre as suas necessidades, para cortar sua 'ajuda de custo' na próxima assembléia. começaram a surgir delatores, que descobriam que alguém tinha comprado clandestinamente um peru para a família num domingo qualquer, provavelmente com o dinheiro que ganhara no jogo. Começamos a nos meter um na vida do outro. Provocávamos brigas de família, para conseguir que os parentes de alguns saíssem da lista de beneficiados. Toda vez que víamos algum homem começando namorar uma moça, tornávamos a vida dele um inferno. Fizemos muitos noivados se romperem. Não queríamos que ninguém se casasse: não queríamos mais dependentes para alimentar.

Antigamente, comemorávamos quando alguém tinha filho, todo mundo contribuía para ajudar a pagar a conta do hospital, quando os pais estavam sem dinheiro no momento. Agora, quando nascia uma criança, ficávamos sem falar com os pais. Para nós, os bebês eram [p.514] agora o que os gafanhotos são para os fazendeiros.

Antigamente, ajudávamos quem tinha um doente na família. Agora . . . Vou contar só um caso para a senhora. Era a mãe de um homem que estava trabalhando conosco há quinze anos. Era uma senhora simpática, alegre e sábia, conhecia todos nós pelo primeiro nome, todos nós gostávamos dela, antes. Um dia ela escorregou na escada do porão, caiu e quebrou a bacia. Nós sabíamos o que isso representava para uma pessoa daquela idade. O médico disse que ela teria que ser hospitalizada, para fazer um tratamento caro e demorado. A velha morreu na véspera do dia em que ia ser removida para o hospital. Ninguém nunca explicou a causa da morte dela. Não, não sei se foi assassinada. Ninguém disse isso. Ninguém comentava nada sobre o assunto. A única coisa que eu sei -- e disso nunca vou me esquecer -- é que eu, também, quando dei por mim estava rezando para que ela morresse. Que Deus nos perdoe! Era essa a fraternidade, a segurança, a abundância que nos haviam prometido com a adoção do plano.

[p.515] E quando a gente via isso, entendia qual era a motivação verdadeira de todo mundo que já pregou o princípio "de cada um conforme sua capacidade, a cada um conforme sua necessidade". Era esse o segredo da coisa. De início, eu não entendia como é que os homens instruídos, cultos e famosos do mundo poderiam fazer um erro como esse e pregar que esse tipo de abominação era direita -- quando bastavam cinco minutos de reflexão para eles verem o que aconteceria quando alguém tentasse pôr em prática essa idéia. Agora eu sei que eles não defendiam isso por erro. Ninguém faz um erro desse tamanho inocentemente. Quando os homens defendem alguma loucura malévola, quando não têm como fazer essa idéia funcionar na prática e não têm um motivo que possa explicar essa sua escolha, então é porque não querem revelar o verdadeiro motivo.

E nós também não éramos tão inocentes assim, quando votamos a favor daquele plano na primeira assembléia. Não fizemos isso só porque acreditávamos naquelas besteiradas que eles vomitavam. Nós tínhamos outro motivo, mas as besteiradas nos ajudavam a escondê-lo dos outros e de nós mesmos, nos davam uma oportunidade de dar a impressão de que era virtude algo que tínhamos vergonha de assumir. Cada um que aprovou o plano achava que, num sistema assim, conseguiria faturar em cima dos lucros dos homens mais capazes. Cada um, por mais rico e inteligente que fosse, achava que havia alguém mais rico e mais inteligente, e que esse plano lhe daria acesso a uma fatia da riqueza e da inteligência daqueles que eram melhores que ele. Mas enquanto ele pensava que ia ganhar aquilo que ele não merecia e que cabia aos que lhe eram superiores, ele esquecia os homens que lhe eram inferiores e que iam querer roubá-lo tanto quanto ele queria roubar seus superiores. O trabalhador que gostava de pensar que suas necessidades lhe davam o direito de ter uma limusine igual à do patrão se esquecia de que todo vagabundo e mendigo do mundo viria gritando que as necessidades deles lhes davam o direito de ter uma geladeira igual à do trabalhador. Era ESSE o nosso motivo para aprovar o plano, na verdade, mas não gostávamos de pensar nisso: e então, quanto mais a idéia nos desagradava, mais alto gritávamos que éramos a favor do bem comum.

Bem, tivemos o que merecíamos. Quando vimos o que havíamos pedido, era tarde demais. Tínhamos caído numa armadilha, e não tínhamos para onde ir. Os melhores de nós saíram da fábrica na primeira semana de vigência do plano. Perdemos nossos melhores engenheiros, superintendentes, chefes, os trabalhadores mais [p.516] qualificados. Quem tem amor-próprio não se deixa transformar em vaca leiteira para ser ordenhada pelos outros. Alguns sujeitos capacitados tentaram seguir em frente, mas não conseguiram agüentar muito tempo. A gente estava sempre perdendo os melhores, que viviam fugindo da fábrica como o diabo da cruz, até que só restavam os homens necessitados, sem mais nenhum dos capacitados. E os poucos que ainda valiam alguma coisa eram aqueles que já estavam lá havia muito tempo.

Antigamente, ninguém pedia demissão da Século Vinte, e a gente não conseguia se convencer de que a Século Vinte não existia mais. Depois de algum tempo, não podíamos mais pedir demissão porque nenhum outro empregador nos aceitaria, aliás com razão. Ninguém queria ter qualquer tipo de relacionamento conosco, nenhuma pessoa nem firma respeitável. Todas as pequenas lojas com que negociávamos começaram a sair de Starnesville depressa, e no final só restavam bares, cassinos e salafrários que nos vendiam porcarias a preços exorbitantes. As esmolas que recebíamos eram cada vez menores, mas o custo de vida subia. A lista dos necessitados da fábrica não parava de aumentar, mas a lista de fregueses diminuía. Havia cada vez menos renda para dividir entre cada vez mais pessoas.

Antigamente, dizia-se que a marca da Século Vinte era tão confiável quanto a marca de quilates num lingote de ouro. Não sei o que pensavam os herdeiros do velho Starnes, se é que eles pensavam alguma coisa, mas imagino que, como todos os planejadores sociais e selvagens, eles achavam que essa marca era um selo mágico que tinha um poder sobrenatural que os manteria ricos, tal como havia enriquecido seu pai. Mas quando nossos fregueses começaram a perceber que nunca conseguíamos entregar uma encomenda dentro do prazo, nem produzir um motor que não tivesse algum defeito, o selo mágico passou a ter o valor oposto: as pessoas não queriam um motor nem dado, se ele ostentasse o selo da Século Vinte.

E no final nossos fregueses eram todos do tipo que nunca pagam o que devem, e nunca têm mesmo intenção de pagar. Mas Gerald Starnes, dopado por sua própria publicidade, ficava todo empertigado, com ar de superioridade moral, exigindo que os empresários comprassem nossos motores, não porque eles fossem bons, mas porque tínhamos muita NECESSIDADE de encomendas.

Àquela altura qualquer imbecil já podia ver o que gerações de professores não haviam conseguido enxergar. De que adiantaria nossa necessidade, para uma usina, quando os geradores paravam porque nossos motores não funcionavam direito? De que ela adiantaria para um paciente sendo operado, quando faltasse luz no hospital? De que ela adiantaria para os passageiros de um avião, quando os motores pifassem em pleno vôo? E se eles comprassem nossos produtos não por causa do seu valor, mas por causa de nossa necessidade, isso seria correto, bom, moralmente certo para o dono daquela usina, o cirurgião daquele hospital, o fabricante daquele avião?

Pois era esta a lei moral que os professores e líderes e pensadores queriam estabelecer por todo o mundo. Se era este o resultado quando ela era aplicada numa única cidadezinha onde todo mundo se conhecia, a senhora pode imaginar o que aconteceria em escala mundial? A senhora pode imaginar o que aconteceria se a senhora tivesse de viver e trabalhar afetada por todos os desastres e toda a malandragem do mundo? Trabalhar -- e quando alguém cometesse um erro em algum lugar, a senhora é que teria de pagar. Trabalhar -- sem jamais ter perspectivas de melhorar de vida, sendo que suas refeições, suas roupas, sua casa e seu prazer estariam à mercê de qualquer trapaça, de qualquer problema de fome ou de peste em qualquer parte do mundo. Trabalhar -- sem nenhuma perspectiva de ganhar uma ração extra enquanto os cambojanos não tivessem sido alimentados e os patagônios não tivessem todos feito faculdade. Trabalhar -- tendo cada criatura no mundo um cheque em branco na mão, gente que a senhora nunca vai conhecer, cujas necessidades a senhora jamais vai conhecer, cuja capacidade e preguiça e desleixo e desonestidade são coisas que a senhora jamais vai saber nem tem direito de questionar -- enquanto as Ivys e os Geralds da vida resolvem quem vai consumir o esforço, os sonhos e os dias de sua vida. E é ESTA lei moral que se deve aceitar? ISTO é um ideal moral?

Olhe, nós tentamos -- e aprendemos. Nossa agonia durou quatro anos, da nossa primeira assembléia à última, e acabou da única [p.517] maneira que podia acabar: com a falência. Na nossa última assembléia foi Ivy Starnes que tentou manter as aparências. Fez um discurso curto, vil e insolente, dizendo que o plano havia fracassado porque o resto do país não o havia aceitado, que uma única comunidade não poderia ter sucesso no meio de um mundo egoísta e ganancioso, e que o plano era um ideal nobre, mas que a natureza humana não era suficientemente boa para que ele desse certo.

Um rapaz -- o mesmo que fora punido por dar uma boa idéia no primeiro ano -- levantou-se, enquanto todos os outros permaneciam calados, e andou até Ivy Starnes no tablado. Não disse nada. Cuspiu na cara dela. Foi assim que acabaram o nobre plano e a Século Vinte.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Five Ways to Change the World

Jonathan Massey is an associate professor of architecture at Syracuse University and author of Crystal and Arabesque: Claude Bragdon, Ornament, and Modern Architecture.








So you want to change the world? Start by changing the built environment. Buildings shape our experience and open up or close down possibilities for life. Hardly anyone gets to realize his or her visions for transforming society, but activism through architecture is a place to start. Here I offer a guide, idiosyncratic and partial, drawing on personal experience and American history, to how architecture can contribute to social reform.

Vote
Given the narrow range of choices on the ballot and the wide range of current concerns, going to the polling place and flipping levers, punching cards or tapping touch-screens can seem futile. But aggregated into majorities at the local, state and federal levels, these tiny gestures have big consequences — not least for architecture and urbanism. Government has direct impact on the built environment through the construction of roads and highways, seaports and airports, schools and universities, police and fire stations and utilities for power, water and sewage. These are constructed through state patronage and they are powerful instruments of policy. Who sits in office shapes our world.

There is no greater example of federal patronage than Franklin Delano Roosevelt’s New Deal. Throughout the 1930s this extraordinary set of programs — enacted to spur recovery from the (first) Great Depression — transformed the nation through huge public works such as the dams and power plants of the Tennessee Valley Authority, and a raft of programs from Social Security to the incentives for homeownership that promoted postwar suburbia. The New Deal was based on the Keynesian principle that state intervention is sometimes necessary to support vitality — a perspective that has informed most large-scale urban development of the past eighty years, and is once again a familiar theme in political debates.

Every time I travel through Albany I marvel at Empire State Plaza, the modernist state capitol complex built in the 1960s and ‘70s, when Nelson Rockefeller was governor of New York. Designed by a team of architects led by Wallace K. Harrison, the plaza replaced an early-20th-century mixed-use downtown neighborhood with a grand modernist mall of administrative offices set atop a podium several stories high and more than a quarter-mile long. Four towers flank its west side and opposite, along the eastern edge, is an even loftier skyscraper of 44 stories. A blocky “cultural education center” anchors one end of the podium, facing off against Leopold Eidlitz’s late 19th-century state capitol, while an egg-shaped theater rounds out the ensemble. Like its Latin American cousin, Brasilia, the Empire State Plaza combines a bold scale and modernist forms to convey the power of the assertive Keynesian state.


Empire State Plaza, Albany, during the late stages of construction.

Impressive in its own right — a 98-acre marble-and-steel statement of the modernist ambition to remake the world — the Albany mall is just a small part of Rockefeller’s architectural legacy. Nelson Rockefeller’s administration built public housing throughout the state, new campuses for the growing state university system, and an expressway connecting Albany to the Interstate. A vote for Rockefeller in 1958, 1962, 1966 or 1970 was a vote for the State University of New York and the New York Thruway — and for large-scale social changes through housing, education, highways and other ambitious public works.

Less apparent but more pervasive are the countless laws that regulate private construction and investment. It’s easy to see how building and zoning codes shape construction; we’re usually less aware of the impact that tax codes have on our buildings, cities and suburbs. By assessing different types of expenditures at different rates, tax codes create a complex web of incentives for individuals and corporations, the consequences of which are diffuse yet extensive. The mortgage interest deduction, for instance, encourages people to buy rather than rent housing by lowering the cost of financing a large loan. Since 1976, tax credits for expenditures on historic preservation have encouraged the restoration and reuse of old buildings. More recently, brownfield credits have rewarded investors who redevelop former industrial sites rather than build on greenfield sites at the urban fringe. The Energy Star program offers homeowners tax credits to offset investments that increase the efficiency of insulation, windows, water heaters and solar and fuel cell energy systems.

Tax-credit programs live and die by legislative consensus, so your ballot filters through the checks and balances of representative government to help determine the choices you have in employment, housing and social life. The end of postwar urban renewal and the decline of modernist planning had many causes — but not least was the political shift from the Keynesian era of Roosevelt and Rockefeller to the privatizing age of Ronald Reagan. A vote for Reagan in the 1980s was a vote against the public-spirited state in favor of market-based policies. During Reagan’s presidency, the Department of Housing and Urban Development stopped funding federal projects in favor of giving tax incentives to private developers to build low-income housing. Today the Great Recession is reviving debate about public solutions, and the Empire State Plaza remains an ambiguous, somewhat forlorn monument to the once assertive liberal agenda.

Shop
Most of us vote only once a year (if that). Almost every day we express our preferences when we take out our wallets. When you decide whether to buy a car, a bike or a bus pass, you register a choice for particular land use patterns, architectural configurations and social orders. Buying and spending are a big part of our lives — especially middle-class American lives. And unlike the mechanisms of political action, shopping offers an easily available and extraordinarily nuanced vehicle of expression and selection. For every top-down utopia, there are a thousand bottom-up initiatives generated by the localized activity of entrepreneurs and consumers. Usually the result is junk, but once in a while something revolutionary crops up.

Consider the automats that flourished during the first half of the 20th century in European and North American cities. Self-service restaurants that merged the vending machine with the cafeteria, automats struck some American critics as harbingers of social decline, seedy eateries selling cheap calories to urban loners. Automats were in fact precursors of the drive-through and the fast-food franchise, and for decades they provided affordable fare in anonymous settings only minimally monitored by staff and managers. The outcome was a new kind of public space that suited the budgets and tastes of women and men living alone in U.S. cities. The mix of plain food, unsupervised setting and plate glass windows made automats as well as cafeterias key arenas for the emergent queer culture of capitalist modernity. Gay men and lesbians turned some of these places, like the Childs Restaurant on Broadway in Times Square, into late-night “fairy hangouts” where, for the price of coffee and a slice of pie, likeminded folks gathered, traded tips about the still largely underground gay world, and showed off pansy fashions that would get them canned at work.

Access to community and visibility made bars and restaurants formative sites for not only for queer social life but also for political activism. In 1966, members of the Mattachine Society, an early gay rights organization, staged a “sip-in” at a West Village bar to protest laws against serving obviously gay patrons. On a legendary night three years later, the trannies, drags, dykes and fags of the Stonewall Inn rebelled against police repression and then celebrated on Christopher Street stoops through the weekend. [1]




John Timmins, Dick Leitsch, Craig Rodwell, and Randy Wicker at the Mattachine Society sip-in at Julius's Bar, New York, April 1966. [Credit: Fred W. McDarrah, Gay Pride: Photographs from Stonewall to Today (Chicago: A Cappella Books, 1994)]

In this gay experience is neither unique nor original. The Mattachine sip-in was inspired by the lunch-counter sit-ins staged by civil rights activists. Commercial spaces were key sites for African-American civil society. In Chicago’s Bronzeville district during the 1920s, black entrepreneurs ran businesses that doubled as transformative social spaces. The neighborhood boomed as the Great Migration brought African-Americans to Chicago from the countryside and the south. Bronzeville was home to the Chicago Defender, an influential black weekly, along with the churches, civic associations, restaurants, nightclubs, theaters and hair salons of one of the largest and fastest-growing black communities in America. In 1922, Anthony Overton constructed a block-long four-story building to house his expanding business in cosmetics for the African-American market. The Overton Hygienic Building also accommodated the entrepreneur’s other businesses, notably the Victory Life Insurance Company and the Douglass National Bank, the first federally chartered black-owned bank. Overton rented ground-floor storefronts and second-floor office space to other businesses and to Bronzeville’s doctors, lawyers and architects. At its heyday, the Overton Building teemed with workers, professionals, customers and clients who were collectively creating a new and distinctly modern social world. Everyone who purchased Overton face cream, a Victory insurance policy or a certificate of deposit from the Douglass bank supported not only the rise of the black middle class but also the construction of African-American urban life and culture — much as, for gay New York, did those who dropped a dime at a Horn & Hardart automat or bellied up to the bar at the Stonewall.



Postcard of the Victory Life Insurance Company office in the Overton Hygienic Building; portrait of Anthony Overton at upper right. [Credit: Early Office Museum]

Today shopping presents fresh challenges and opportunities. Who has not begun to assess every transaction for its impact on the fate of the earth? The ways we produce and consume energy, food, goods and the built environment have broad consequences for the future of society and the planet. By highlighting these consequences, advocates of sustainability have moralized consumption to the point where every purchase, from light bulbs and dish soap to the house itself, is now freighted with responsibility for saving or damning the planet. This is as it should be, and new ways of living are emerging from discussions in living rooms and workplaces around the country; a lot of these are then collected in websites and books like Worldchanging, the “user’s guide for the 21st century” in shelter, community and politics. [2] But sustainability is burdened with conflicting social and political agendas, and corporations seeking to capture more profit often manipulate the emotional investments that people bring to shopping decisions. But why not reduce your ecological footprint? Choose a smaller house or an apartment in walking and biking distance of work, food markets, bars and cafés. Fix up existing housing rather than moving to an exurban greenfield. Who wants a multicar garage and a home theater anyway?

The impact of any single purchase may be small. Yet, as with votes, individual expenditures aggregate to create large outcomes. Investment banks track spending patterns; once a trend is established, the banks are more likely to underwrite ventures linked to that trend. A feedback cycle ensues as entrepreneurs take advantage of favorable financing. This is how fast food franchises came to rule the earth, or at least the suburbs. But because they rarely play the socially transformative roles automats once played, I don’t see why anyone should patronize them. Join a community-supported agricultural cooperative or shop at a greenmarket. You’ll help lower the cost of the financing these ventures, and have a better meal while you’re at it.

Build a House
Houses can be pivots of social transformation. They provide the context for many consumption decisions; they shape the patterns of daily life and intimate relationships. Buckminster Fuller recognized the centrality of the house to social change when, in 1928, he set out to transform how we produce and consume housing, with the goal of improving family life. Inspired by Henry Ford’s Model T, which made automobiles affordable through assembly-line production, Fuller designed a lightweight, super-efficient aluminum dwelling intended for mass production in single- and multi-family versions. A standardized hexagonal floor plan would have provided occupants of the Dymaxion House with a suite of well-lit, well-ventilated rooms furnished with modern kitchen, bathroom and media equipment. The structure was designed to hang from a central mast by cables akin to nautical rigging, allowing one or more floors to be stacked up and suspended above the ground. Dymaxion housing was to transform human society by systematically reducing the waste of resources from energy and materials to labor and time.

Unlike the automobiles that inspired them, Fuller’s house never went into production. If it had, and had it worked as Fuller planned, the Dymaxion would have liberated families from dependence on electrical and gas networks, water supplies, sewer systems and roads as well as the social and financial systems — above all mortgages — that bond us to what Fuller considered a form of serfdom. Airlifted by dirigible from factory to building site, its mast anchored in a crater excavated by a bomb, his “autonomous dwelling unit” would have been installed wherever its owner found the best opportunities for work and leisure. In Fuller’s vision, these mobile dwellings would have created a self-regulating labor market as workers were freed to follow jobs. The state would have dissolved into a self-optimizing industrial economy in which consumers dealt directly with transnational corporations. Rather than maintaining large houses and working to meet mortgage payments, families would have been free to dedicate themselves to creative pursuits and domestic pleasures. [3]

Much as I admire the ambition of Fuller’s utopian propositions, I’ve come to realize that it takes a lot of grit to live even a little bit differently from others. Commissions for individual houses have perennially afforded architects and clients opportunities to experiment with new modes of living. In Women and the Making of the Modern House, Alice T. Friedman examines instances in which architects and female clients produced unusual houses that shifted the rhythms and rules of daily life. My favorite among her case studies is the house in Utrecht, designed by Gerrit Rietveld in 1924 for the widow Truus Schröder, who was seeking a flexible, egalitarian environment for herself and her children. The intersecting floor plates, beams, walls and windows of this modernist landmark are best known as compelling applications of De Stijl principles to architectural design. More importantly, though, the house’s multipurpose furniture and sliding wall panels enabled family members to define the degrees of intimacy or withdrawal they wanted. By granting occupants the freedom to reshape the house through moment-by-moment choices about how to live separately and together, the Schröder House demonstrated the capacity of architecture to open up alternative possibilities for everyday home life. [4]



King's Road House, Rudolph M. Schindler, 1921-1922.

The equally innovative King’s Road House in West Hollywood, California, also shows how architecture can foster new modes of living. Vienna-born architect R. M. Schindler designed this double house to accommodate himself and his wife Sophia as well as another couple, Clyde and Marian Chace, and two newborns. Four large rooms, built of concrete and redwood, have sliding walls that open onto partially enclosed patios and gardens. A single kitchen, garage and guest suite adjoin these rooms. Envisioned as studios for living and creative work for the four adults in this cooperative household, they provided each person with a discrete space that could be opened to or separated from the others. Narrow glass strips between concrete wall-slabs ensured that even with all the partitions closed, no one was completely sealed off from the household, and the shared kitchen encouraged collaboration in the rituals of daily life. Built in 1921, the house reflected traditional gender roles: the women’s studios adjoined the kitchen because, as Schindler noted, “the wives take alternate weekly responsibility for dinner menus.” Nonetheless, the King’s Road House established an unconventional model of domesticity at a scale somewhere between that of the nuclear family and the community. [6]

Should you ever be fortunate enough to build your own house, keep in mind how domestic architecture orders daily life and try changing the game.

Raise a Barn
Cooperative or communal building, epitomized by barn raising, is yet another way architecture can promote social transformation. In most places barn raising is a lost tradition, but throughout the 18th and 19th centuries it was common for community members to gather voluntarily to help a family build a barn. Cooperative practice has been extended to many forms of construction, especially churches, houses and schools, and even to the development of larger settlements. Take the example of Drop City. Inspired by Fuller’s teachings, a group of artists created a commune in the southern Colorado desert during the Vietnam War as a place where they could drop out of the consumer economy to experiment with low-tech “natural” living. They constructed a village of geodesic dome homes, jerry-built of material like scavenged car hoods, salvaged lumber and recycled insulation. With its crazy-quilt folk aesthetic, quasi-sustainable design, and free lifestyle, Drop City has come to symbolize the dream of living outside the mainstream. Collaborating on a building project can be a step toward re-founding society.

At the other extreme of scale and sensibility is Co-op City, a mega-development of apartment towers in the Bronx that houses some 60,000 residents in 15,000 apartments. Built in the late 1960s, Co-op City is the largest cooperative housing project in the United States, and it exemplifies both the promise and the pitfalls of such big-scale endeavors. The United Housing Foundation, a nonprofit organization affiliated with the Amalgamated Clothing Workers of America, developed the project with funding from the New York State Housing Finance Agency, which lent the UHF millions of dollars through the Mitchell-Lama program. A typical Rockefeller initiative, the program aimed to subsidize housing for middle-class New York City residents who might otherwise move to the suburbs. The product of a rare convergence between labor-union idealism and the mechanisms of the Keynesian state, Co-op City was promoted as an outer-borough Shangri-La of spacious apartments at low cost for its cooperators, mostly Jewish workers who were moving out of dilapidated 19th-century housing throughout the city. But poor planning, incomplete land reclamation, shoddy construction and outright theft by some construction companies jeopardized the project from the start. Enraged by rapid escalation in monthly maintenance fees, the cooperators staged a payment strike. Their stand-off with city and state was resolved only through the infusion of hundreds of millions more in state funding. Today, Co-op City is a functional if not especially vibrant neighborhood of African-American, Latino and white households. It inspires awe for the scale of its ambition and disappointment for the gap between that ambition and eventual realities. Like Empire State Plaza, it memorializes the ambiguous legacy of modernist social, urban and architectural innovation. [7]

Cooperative initiatives of recent years are typically modest in scale and fully or partially self-built. These include the barn raising-like work of Habitat for Humanity, Design Corps and Architecture for Humanity. These nonprofit organizations build houses and community facilities, one at a time, through volunteer labor and sweat equity from beneficiaries. Belief in the value of community also anchors the growing sector of small- and medium-scale ventures often called co-housing. In co-housing, private units are clustered together and share communal facilities. Typically developed by middle-class residents, these intentional communities can evoke the utopian tradition of places like Brook Farm, Fourierist phalansteries, the Oneida Community, Shaker settlements and Drop City. But more often they reflect simply the desire for strong social bonds and a broad family circle — the same desire than animated the Schindlers and Chaces eighty-five years ago.

A thousand-acre ranch in California’s Napa Valley, owned and inhabited by seventeen shareholders and their partners, gave me the opportunity to test a co-op project. Initiated in the late 1980s by a wealthy San Franciscan, Green Valley Ranch has been placed in a land trust that limits development to preserve open space for grazing and viniculture. The shareholders have built three communal houses that center on large, shared kitchens, dining rooms and patios but offer different combinations of private suites and shared facilities. The houses provide members (a mix of full- and part-time residents) a choice among different degrees of interaction and seclusion. To participate in one of their collective dinners — or in their famed New Year’s Eve party — is to experience a compelling alternative to conventional modes of domesticity.

Another model of communitarian life is offered by Crossroads Community, a feminist endeavor started in the 1970s by artist Bonnie Ora Sherk. One in a series of art projects that explored the relationship between ecology and social life, Crossroads combined intelligence, ambition and pragmatism. Working with city agencies and arts organizations, Sherk and a team of volunteers transformed a barren seven-acre site adjacent to a San Francisco freeway interchange into The Farm, a community center that functioned as both an alternative art space and a demonstration of urban agriculture. Gardens, livestock pens, classrooms, a theater and a preschool formed what Sherk called “a life-scale environmental and social artwork that brought many people from different disciplines and cultures together with each other and with other species — plants and animals.” Now a city park with community gardens, The Farm revealed how a marginal site can become a catalyst in urban development and social life. [8]



Concept drawing, Bonnie Ora Sherk, used beginning in 1974 to gather support for the founding of Crossroads Community, San Francisco. [Credit: Bonnie Ora Sherk]

The barn raisings of nonprofit housing groups, co-housers and similar partnerships usually matter less for their formal qualities than for their social impact. Sherk’s Farm reminds us that architecture’s transformative capacities are activated through social elaboration. Plan, space, form and materiality: all are just potential until a building is occupied and really used.

Throw a Party
Maybe you don’t have the money to build the house of your dreams, or the doggedness to found a commune? Throw a party! Ephemeral events can project possibilities beyond reach in daily reality.

A century ago, progressive reformers used pageants, processions and festivals to portray ideal social orders. Few events were as grandiose as the history pageant staged by the city of St. Louis in 1914 to celebrate the 150th anniversary of its founding. Contingents from the city’s ethnic and social groups performed an allegorical masque narrating their diverse histories and envisioning a glorious future unity. Such spectacles intensified civic pride even as they helped to link disparate groups so they could work together to govern the city and plan its future.

One year earlier, the National American Woman Suffrage Association held a pageant in Washington, D.C., that used the colossal Doric colonnade of the Treasury Building as the setting for dance and theater performances representing advances in women’s liberation. Appropriating the neoclassical architecture of a government building, the organizers identified their modern cause with the democracy of ancient Greece. That same year, the National Association for the Advancement of Colored People employed a similar strategy in honoring the fiftieth anniversary of the Emancipation Proclamation. With sets that evoked ancient Egyptian architecture, “The Star of Ethiopia” mobilized an alternative tradition to legitimize African-American history, culture and political claims. Another influential pageant of 1913, the Paterson Strike Pageant, used public drama to promote the cause of striking silk workers in New Jersey. Through architecture, art, drama, singing and dance, all these events engaged spectators and participants alike in reimagining history and redefining the social order.



Suffrage pageant, with Hedwig Reicher as "Columbia," at the U.S. Treasury Building, Washington DC, 1913. [Credit: Library of Congress, Prints and Photographs Division]

Maybe this progressive era pageantry is a bit earnest for your taste. What about disco? Discos and other throbbing dance parties create immersive, affective environments that excite the full spectrum of human senses — and most of our body parts. In a lively account of disco culture, Peter Shapiro contended that gay scenes of the 1970s embraced a Deleuzian mode of political resistance that creates alternative order through the multiplication of desires and pleasures. “The group grope of the disco dance floor, the anonymous antics of the back room, and the heedless hedonism of the bathhouses,” Shapiro wrote, “were probably as close to such a polymorphously perverse paradise as humans will ever get.” [9]

Ecstasy takes many forms. It is commercialized and commodified in theme parks and vacation resorts. It is ritualized as carnival in São Paulo, New Orleans and Nevada’s Black Rock Desert, where the Burning Man Festival convenes an alternative art community every August. And it is institutionalized by art organizations, as is the case with the Summer Warm-Up parties hosted by P.S.1, the contemporary art center in Queens, New York, since 1999. At their best, the P.S.1 parties draw festive crowds that gather energy from innovative installations in the center’s courtyard. My favorite so far has been the first, for which the Austrian art collective Gelatin turned the courtyard into a ludic landscape imaginatively constructed from salvaged artifacts and animated by music from a changing roster of DJs. Participants danced in a fog-filled, plastic bubble, climbed a tower built of old office furniture to survey the crowd, and chilled in an igloo-like pavilion created by stacked rings of air conditioners and door-less refrigerators turned to face one another. Aided by architecture, music and alcohol, the crowd turned the grounds into a distinctively sociable pleasure-ground.



Gelatin installation, P.S. 1, New York, Summer Warm-Up, 1999, showing office-furniture tower and fog bubble. [Credit: Courtesy of Gelatin]

The Flux events staged by artists at desolate sites in and around Pittsburgh offer edgier experiences of festival mixed with industrial salvage. At a recent event in the distressed steel town of Braddock, my friends and I wandered through art installations in an empty Carnegie library. Bands played in an old church across the street; adjacent buildings filled with festival-goers drinking beer, watching film art or dancing to mad beats. Projected images animated building facades while fires burned in oil drums in the street. I will forever remember the abandoned center of this depressed town as the vital heart of western Pennsylvania.

By convening a particular alternative public for a communal ritual, such events can remap the city in perception and memory. They create topographies of feeling that resonate long after the music has stopped. So dive in. Party on. You could do more to change the world, but also less.



Credit

“Five Ways to Change the World” is part of a collection of essays, Learning from Harlem, Port-au-Prince, Urobo, Filadelfia, Marcovia, Aranya, Malawi, Gambia, Pretoria, edited by Hansy Better, and forthcoming from Periscope Publishing.

Notes

1. See Chapter 6, George Chauncey, Gay New York: Gender, Urban Culture, and the Making of the Gay Male World, 1890-1940 (New York: Basic Books, 1994).

2. For pointers, see Worldchanging: A User’s Guide for the 21st Century, ed. Alex Steffen (New York: Harry N. Abrams, 2008). For a discussion of the affective dimension of our relation to waste in the sustainability era, see Gay Hawkins, The Ethics of Waste (Oxford: Rowman and Littlefield, 2006).

3. Fuller unfolded his semi-brilliant, semi-delusional thinking in books such as 4D Time Lock (Albuquerque: Biotechnic Press, 1972), and Nine Chains to the Moon (Philadelphia: J. B. Lippincott, 1938). See also my own analyses in “Buckminster Fuller’s Cybernetic Pastoral: The United States Pavilion at Expo 67,” Journal of Architecture, 11:4, September 2006, 463–483; “Necessary Beauty: Fuller’s Sumptuary Aesthetic,” in New Views on R. Buckminster Fuller, ed. Roberto Trujillo and Hsaio-Yun Chu (Palo Alto: Stanford University Press, 2009, 99–124); or “The Sumptuary Ecology of Buckminster Fuller’s Designs,” forthcoming in A Keener Perception; Ecocritical Studies in American Art History, ed. Alan Braddock and Christoph Irmscher.

4. See Chapter 2, Alice T. Friedman, Women and the Making of the Modern House: A Social and Architectural History (New York: Harry N. Abrams, 1998).

5. Schindler’s statement appears in his essay, “A Cooperative Dwelling,” T-Square 2, February 1932, 20-21, reprinted in Kathryn Smith, Schindler House (New York: Harry N. Abrams, 2001, 81–82).

6. Christine Macy and Sarah Bonnemaison discuss Drop City and other Fuller-inspired dome homes in Chapter 6 of Architecture and Nature: Creating the American Landscape (London and New York: Routledge, 2003). See also Felicity D. Scott, Architecture or Techno-Utopia: Politics After Modernism (Cambridge: MIT Press, 2007), especially Chapter 7.

7. On Co-Op City, see Ian Frazier, “Utopia, the Bronx,” The New Yorker, June 2006, 54.

8. Sherk describes Crossroads Community on her website. See also Wack! Art and the Feminist Revolution, ed. Cornelia Butler (Los Angeles: Museum of Contemporary Art; Cambridge: MIT Press, 2007), 297–298.

9. Peter Shapiro, Turn the Beat Around: The Secret History of Disco (New York: Faber and Faber, 2005).

domingo, 8 de novembro de 2009

Da minha precoce nostalgia

Por Maria Sanz Martins

Quando eu for bem velhinha, espero receber a graça de, num dia de domingo, me sentar na poltrona da biblioteca e, bebendo um cálice de Porto, dizer a minha neta:
- Querida, venha cá. Feche a porta com cuidado e sente-se aqui ao meu lado. Tenho umas coisas pra te contar.
E assim, dizer apontando o indicador para o alto:
- O nome disso não é conselho, isso se chama corroboração!
Eu vivi, ensinei, aprendi, caí, levantei e cheguei a algumas conclusões. E agora, do alto dos meus 82 anos, com os ossos frágeis a pele mole e os cabelos brancos, minha alma é o que me resta saudável e forte.
Por isso, vou colocar mais ou menos assim:
É preciso coragem para ser feliz. Seja valente.
Siga sempre seu coração. Para onde ele for, seu sangue, suas veias e seus olhos também irão.
E satisfaça seus desejos. Esse é seu direito e obrigação.
Entenda que o tempo é um paciente professor que irá te fazer crescer, mas escolha entre ser uma grande menina ou uma menina grande, vai depender só de você.
Tenha poucos e bons amigos. Tenha filhos. Tenha um jardim. Aproveite sua casa, mas vá a Fernando de Noronha, Rio de Janeiro, a Barcelona e a Austrália. Cuide bem dos seus dentes.
Experimente, mude, corte os cabelos. Ame. Ame pra valer, mesmo que ele seja o carteiro.
Não corra o risco de envelhecer dizendo "ah, se eu tivesse feito..."
Tenha uma vida rica de vida.
Vai que o carteiro ganha na loteria - tudo é possível, e o futuro é imprevisível.
Viva romances de cinema, contos de fada e casos de novela.
Faça sexo, mas não sinta vergonha de preferir fazer amor.
E tome conta sempre da sua reputação, ela é um bem inestimável. Porque sim, as pessoas comentam, reparam, e se você der chance elas inventam também detalhes desnecessários.
Se for se casar, faça por amor. Não faça por segurança, carinho ou status.
A sabedoria convencional recomenda que você se case com alguém parecido com você, mas isso pode ser um saco!
Prefira a recomendação da natureza, que com a justificativa de aperfeiçoar os genes na reprodução, sugere que você procure alguém diferente de você. Mas para ter sucesso nessa questão, acredite no olfato e desconfie da visão. É o seu nariz quem diz a verdade quando o assunto é paixão.
Faça do fogão, do pente, da caneta, do papel e do armário, seus instrumentos de criação. Leia.
Pinte, desenhe, escreva. E por favor, dance, dance, dance até o fim, se não por você, o faça por mim.
Compreenda seus pais. Eles te amam para além da sua imaginação, sempre fizeram o melhor que puderam, e sempre farão.
Cultive os amigos. Eles são a natureza ao nosso favor e uma das formas mais raras de amor.
Não cultive as mágoas - porque se tem uma coisa que eu aprendi nessa vida é que um único pontinho preto num oceano branco deixa tudo cinza.
Era só isso minha querida. Agora é a sua vez. Por favor, encha mais uma vez minha taça e me conte: como vai você?

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Para onde vamos?

Fernando Henrique Cardoso

A enxurrada de decisões governamentais esdrúxulas, frases presidenciais aparentemente sem sentido e muita propaganda talvez levem as pessoas de bom senso a se perguntarem: afinal, para onde vamos? Coloco o advérbio "talvez" porque alguns estão de tal modo inebriados com "o maior espetáculo da Terra", de riqueza fácil que beneficia poucos, que tenho dúvidas. Parece mais confortável fazer de conta que tudo vai bem e esquecer as transgressões cotidianas, o discricionarismo das decisões, o atropelo, se não da lei, dos bons costumes. Tornou-se habitual dizer que o governo Lula deu continuidade ao que de bom foi feito pelo governo anterior e ainda por cima melhorou muita coisa. Então, por que e para que questionar os pequenos desvios de conduta ou pequenos arranhões na lei?

Só que cada pequena transgressão, cada desvio vai se acumulando até desfigurar o original. Como dizia o famoso príncipe tresloucado, nesta loucura há método. Método que provavelmente não advém do nosso príncipe, apenas vítima, quem sabe, de apoteose verbal. Mas tudo o que o cerca possui um DNA que, mesmo sem conspiração alguma, pode levar o País, devagarzinho, quase sem que se perceba, a moldar-se a um estilo de política e a uma forma de relacionamento entre Estado, economia e sociedade que pouco têm que ver com nossos ideais democráticos.

É possível escolher ao acaso os exemplos de "pequenos assassinatos". Por que fazer o Congresso engolir, sem tempo para respirar, uma mudança na legislação do petróleo mal explicada, mal-ajambrada? Mudança que nem sequer pode ser apresentada como uma bandeira "nacionalista", pois, se o sistema atual, de concessões, fosse "entreguista", deveria ter sido banido, e não foi. Apenas se juntou a ele o sistema de partilha, sujeito a três ou quatro instâncias político-burocráticas para dificultar a vida dos empresários e cevar os facilitadores de negócios na máquina pública. Por que anunciar quem venceu a concorrência para a compra de aviões militares, se o processo de seleção não terminou? Por que tanto ruído e tanta ingerência governamental numa companhia (a Vale) que, se não é totalmente privada, possui capital misto regido pelo estatuto das empresas privadas? Por que antecipar a campanha eleitoral e, sem nenhum pudor, passear pelo Brasil à custa do Tesouro (tirando dinheiro do seu, do meu, do nosso bolso...) exibindo uma candidata claudicante? Por que, na política externa, esquecer-se de que no Irã há forças democráticas, muçulmanas inclusive, que lutam contra Ahmadinejad e fazer mesuras a quem não se preocupa com a paz ou os direitos humanos?

Pouco a pouco, por trás do que podem parecer gestos isolados e nem tão graves assim, o DNA do "autoritarismo popular" vai minando o espírito da democracia constitucional. Esta supõe regras, informação, participação, representação e deliberação consciente. Na contramão disso tudo, vamos regressando a formas políticas do tempo do autoritarismo militar, quando os "projetos de impacto" (alguns dos quais viraram "esqueletos", quer dizer, obras que deixaram penduradas no Tesouro dívidas impagáveis) animavam as empreiteiras e inflavam os corações dos ilusos: "Brasil, ame-o ou deixe-o." Em pauta temos a Transnordestina, o trem-bala, a Norte-Sul, a transposição do São Francisco e as centenas de pequenas obras do PAC, que, boas algumas, outras nem tanto, jorram aos borbotões no Orçamento e mínguam pela falta de competência operacional ou por desvios barrados pelo Tribunal de Contas da União. Não importa, no alarido da publicidade, é como se o povo já fruísse os benefícios: "Minha Casa, Minha Vida"; biodiesel de mamona, redenção da agricultura familiar; etanol para o mundo e, na voragem de novos slogans, pré-sal para todos.

Diferentemente do que ocorria com o autoritarismo militar, o atual não põe ninguém na cadeia. Mas da própria boca presidencial saem impropérios para matar moralmente empresários, políticos, jornalistas ou quem quer que seja que ouse discordar do estilo "Brasil potência". Até mesmo a apologia da bomba atômica como instrumento para que cheguemos ao Conselho de Segurança da ONU - contra a letra expressa da Constituição - vez por outra é defendida por altos funcionários, sem que se pergunte à cidadania qual o melhor rumo para o Brasil. Até porque o presidente já declarou que em matéria de objetivos estratégicos (como a compra dos caças) ele resolve sozinho. Pena que se tenha esquecido de acrescentar: "L"État c"est moi." Mas não se esqueceu de dar as razões que o levaram a tal decisão estratégica: viu que havia piratas na Somália e, portanto, precisamos de aviões de caça para defender o "nosso pré-sal". Está bem, tudo muito lógico.

Pode ser grave, mas, dirão os realistas, o tempo passa e o que fica são os resultados. Entre estes, contudo, há alguns preocupantes. Se há lógica nos despautérios, ela é uma só: a do poder sem limites. Poder presidencial com aplausos do povo, como em toda boa situação autoritária, e poder burocrático-corporativo, sem graça alguma para o povo. Este último tem método. Estado e sindicatos, Estado e movimentos sociais estão cada vez mais fundidos nos altos-fornos do Tesouro. Os partidos estão desmoralizados. Foi no "dedaço" que Lula escolheu a candidata do PT à sucessão, como faziam os presidentes mexicanos nos tempos do predomínio do PRI. Devastados os partidos, se Dilma ganhar as eleições sobrará um subperonismo (o lulismo) contagiando os dóceis fragmentos partidários, uma burocracia sindical aninhada no Estado e, como base do bloco de poder, a força dos fundos de pensão. Estes são "estrelas novas". Surgiram no firmamento, mudaram de trajetória e nossos vorazes, mas ingênuos capitalistas recebem deles o abraço da morte. Com uma ajudinha do BNDES, então, tudo fica perfeito: temos a aliança entre o Estado, os sindicatos, os fundos de pensão e os felizardos de grandes empresas que a eles se associam.

Ora, dirão (já que falei de estrelas), os fundos de pensão constituem a mola da economia moderna. É certo. Só que os nossos pertencem a funcionários de empresas públicas. Ora, nessas, o PT, que já dominava a representação dos empregados, domina agora a dos empregadores (governo). Com isso os fundos se tornaram instrumentos de poder político, não propriamente de um partido, mas do segmento sindical-corporativo que o domina. No Brasil os fundos de pensão não são apenas acionistas - com a liberdade de vender e comprar em bolsas -, mas gestores: participam dos blocos de controle ou dos conselhos de empresas privadas ou "privatizadas". Partidos fracos, sindicatos fortes, fundos de pensão convergindo com os interesses de um partido no governo e para eles atraindo sócios privados privilegiados, eis o bloco sobre o qual o subperonismo lulista se sustentará no futuro, se ganhar as eleições. Comecei com para onde vamos? Termino dizendo que é mais do que tempo de dar um basta ao continuísmo, antes que seja tarde.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República
Ver olhar enxergar

Daniel Piza

Há alguns anos, sentado no jardim do Museu Rodin, de frente para uma das réplicas grandes de O Pensador, reparei que muitas pessoas se aproximavam e logo tratavam de imitar sua posição, apoiando o cotovelo na coxa e o queixo na mão e olhando para baixo. Das vinte que contei, apenas uma se deu conta de que, instintivamente, tinha feito errado: todas as demais apoiaram o cotovelo direito na coxa direita - e não na esquerda, como na escultura. Além disso, invariavelmente fecharam a mão, quando na realidade os dedos estão esticados. As diferenças estão longe de ser detalhe. A chave do estilo de Rodin - aquilo que o separa do classicismo - é a tensão, expressa sobretudo na angulosidade de suas formas e na irregularidade de sua superfície. Ele trabalhava sempre com situações no limite do equilíbrio e, por isso, a meu ver, a dinâmica de volumes do corpo feminino foi (com trocadilho) seu maior campo de estudos.

Que uma das imagens mais surradas da história da arte - um "ícone", como se usa e abusa hoje, desvirtuando o significado original do termo (representação sagrada, na religião; ou representação fisicamente semelhante ao objeto, na semiótica) - não seja devidamente apreendida por inúmeros observadores é um fato relevante para estes tempos que se dizem "Era Visual". O Pensador, a propósito, não foi concebido isoladamente por Rodin (que acaba de ganhar belo museu em Salvador, com projeto de Marcelo Ferraz e Francisco Fannucci, e mais uma exposição em São Paulo, no Masp), mas como parte de A Porta do Inferno, no alto da qual está como Dante a meditar sobre os infortúnios humanos. Também sua testa está franzida, seus músculos retesados e seus artelhos dobrados. Tirar sua tensão dramática é tirar o que tem de substancial.

O objetivo da figura, enfim, não era caricaturizar o ato do pensamento; era traduzir sua dor e a individualidade dessa dor.

***

Em seu belo livro Olhar Escutar Ler, que mostra como era bem menos relativista do que seus seguidores gostariam, o antropólogo Claude Lévi-Strauss comentou que diante de uma tela de Poussin temos a impressão de estar diante de "um pequeno teatro", de uma espécie de "segundo grau" ou "segunda natureza" que parece artificial, mas cujo resultado é se aprofundar ainda mais na realidade. Também notou que é um recurso muito distinto da estratégia dita pós-moderna, que quase sempre se basta na aparência da linguagem.

Diante de Hymeneus Travestido Assistindo uma Dança em Honra a Príapo, pintura de Poussin datada de 1632-34 que foi restaurada e está de novo em exibição no Masp, a impressão não poderia ser outra. Contei no blog como fiquei encasquetado com a definição dos especialistas de que Himeneus, o jovem que se vestiu de mulher para observar a dança feminina ao deus da fertilidade, é a figura da direita, alegando que é por ser a única que veste sandálias. Para mim, há outra hipótese, uma figura ao centro com traços mais masculinos - especialmente o maxilar e os braços - e a única com vestes sem decote e cabelos presos. Além disso, esta segura o falo da estátua, o qual ressurgiu graças ao excelente restauro.

Poussin não tinha um compromisso estritamente realista, o que explicaria essa opção simbólica (e Himeneus aparece segurando uma tocha em outras representações), que acentua seu desejo de ser sedutor para a amada. Mas há muitas dúvidas sobre o quadro, a começar por seu título. O curador do Masp, Teixeira Coelho, me disse que já cronometrou o tempo médio que cada pessoa se detém vendo uma pintura: oito segundos! Assim não é possível compreender um Poussin, por exemplo, com sua combinação de rigor e vitalidade. A estrutura atrás das mulheres, uma pérgola geométrica, e a coreografia dos braços numa faixa horizontal que ela reverbera, numa composição classicista "ma non troppo", pedem uma observação cheia de calma e dúvida ao mesmo tempo - como toda grande obra de arte, na fusão de forma e conteúdo.

***

Lévi-Strauss, que fez muitas fotos no Brasil e depois as publicou em livro, não gostava muito dessa moda de exagerar a importância artística da fotografia. Imagino o que acharia hoje, quando o status dela não parece parar de crescer. Em São Paulo há diversas exposições, com destaque para as de Henri Cartier-Bresson (no Sesc Pinheiros) e Walker Evans (também no Masp); em Nova York, a retrospectiva de Robert Frank tem atraído muita mídia e público. Eu acho que são muito bem-vindas, antes de mais nada por serem de grandes mestres, e talvez Lévi-Strauss se consolasse ao pensar que a tendência pode refletir certa nostalgia da figura humana, abandonada pelas chamadas "artes plásticas" (prefiro "artes visuais").

Bresson é outro que dialoga diretamente com o clássico. Alguns analistas tendem a dar ênfase ao caráter de flagrante de suas fotos, lembrando sempre que ele mesmo disse que usava a Leica porque favorece o "tiro único" ("one shot"), em contraposição às fotos mais posadas ou construídas. Só que não existe foto em que Bresson - e a exposição do Sesc, embora não deixe muito espaço de respiro entre uma e outra, está repleta de exemplos - não mostre um senso de composição apurado, um rigor de luz e espaço que valoriza ainda mais o dado espontâneo, o gesto natural, a coincidência surpreendente; por isso, o chamo de "pintor dos instantes". (Entre os brasileiros com fotos bressonianas na exposição, Cristiano Mascaro e Juan Esteves se destacam.)

Walker Evans, por sua vez, gosta do cenário desarrumado, do contraponto entre o ambiente e as figuras que captou durante a Depressão, como no Alabama (onde fez o livro com o grande jornalista, crítico e escritor James Agee, Elogiemos os Homens Ilustres, a ser lançado neste mês no Brasil). A série feita no metrô de Nova York também é um primor, com as figuras emolduradas pela câmera à mesma altura, não raro do pescoço para cima. Um pequeno deslocamento do ponto de vista do fotógrafo produz enorme diferença, como no "cinema de tatame" do genial Ozu ou como o cotovelo cruzado no Pensador.

***

Outro dos exageros teóricos da crítica no século 20 - estou pensando em nomes como Herbert Read e Clement Greenberg - foi a defesa da tese de que a pintura abstrata é a que busca "o grau zero da representação" e só pode ser avaliada como "mero arranjo de formas e cores". Basta ver Virada Russa, outra boa exposição em São Paulo (no CCBB), olhar os trabalhos de Kandinski, Malevitch e Tatlin e enxergar que não é bem assim. A pintura de Kandinski deriva de sua extensa pesquisa de paisagens, das quais jamais se afastou; a de Malevitch é carregada de metafísica, de gravidade religiosa, em suas cruzes com desvios de simetria; e a de Tatlin contém um projeto utópico, um design que afirma a máquina e a indústria, o futuro a ser erguido pela razão revolucionária - tema presente em quase todas as obras da exposição, inclusive as do social-realismo, de uma figuração kitsch sem tamanho. Eles podiam alegar pretensões de "pureza"; nós não precisamos assinar embaixo.

***

Fiz também no blog uma enquete sobre o melhor quadro da arte brasileira. Escolhi dez de minhas pinturas preferidas, sofrendo por excluir nomes como Antonio Bandeira, Lasar Segall e Flávio de Carvalho, além dos pré-modernos (como Eliseu Visconti) e dos construtivistas (como Hélio Oiticica). Até quinta à tarde, porém, já foi possível ver como os livros de história precisam ser reescritos, tanto os que privilegiam os grão-modernos quanto os que veem tudo como antessala de uma emancipação nacional que só se daria com a arte "tridimensional" do próprio Oiticica e de Lygia Clark. Boa parte dos visitantes, como eu, prefere autores que não se encaixam nessas classificações, como Oswaldo Goeldi (A Chuva), que estava à frente de Portinari (O Lavrador); o Iberê Camargo da última fase (A Solidão); o Guignard das paisagens de Ouro Preto; e também Pancetti e Volpi. Quando teremos uma história da arte que enxergue obras em vez de sociologia?

DE LA MUSIQUE

Luz da Aurora é um belo CD do violonista Yamandu Costa com o bandolinista Hamilton de Holanda. Com exceção de Escorregando, de Ernesto Nazareth, todas as canções são de um e/ou do outro. A faixa-título tem toda a melancólica alegria que o nome sugere. Outro duo de cordas dá show em Duofel Plays the Beatles, com harmonias e reverberações que o destacam no povoado mundo das reinterpretações de canções como She"s Leaving Home e A Day in the Life.

POR QUE NÃO ME UFANO

Pressão sobre a Vale. Modelo de partilha no pré-sal. Aumento dos gastos públicos. Reforço aos fundos de pensão. Bolsa Cultura. Filme biográfico. Inaugurações do PAC, mesmo que incompletas. Taxação financeira. Acordo - a que custo? - com o PMDB de Sarney. Desminta ou não, o governo Lula já pôs o Estado-mãe no palanque para 2010.


Aforismos sem juízo

Muitos veem, alguns olham, poucos enxergam.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Architects can learn a lot by playing golf

Don’t roll your eyes: Architects can learn a lot by playing golf

By Robert Campbell, FAIA
I know people will be reading this in crisp October, but as I write I’m hanging on to summer in the week before Labor Day. Summer is a time for many things. One of them, for the right-minded architect, is golf. I realize that I’ll alienate some readers here, but golf and architecture are, I believe, related activities. Golf is said to be an old person’s sport — witness Tom Watson, who almost won the British Open this summer at age 59 — and as we all know, architects, like symphony conductors, tend to flourish in their later years. I.M. Pei was 91 when his museum of Islamic Art recently opened in Qatar.


Mark Twain said, “Golf is a good walk spoiled,” a snotty comment that is usually quoted by people who’ve never picked up that amazingly crafted artifact, a golf club. Twain was seldom wrong, but this time he blew it.

Golf is the only sport that is played in a landscaped garden. A golf course, especially an American one, is the latest and perhaps the final iteration of a great design movement, namely the English country garden of the 18th century, the movement we associate with names like Capability Brown and William Kent. Like Stowe or Stourhead or Rousham, a golf course is an entirely artificial landscape that has been reconfigured in such a way as to resemble the more romantic, naturally sloping meadows of a sheep farm or deer park.

All the old tricks are here: The picturesque grove or single tree sited in exactly the right position to punctuate a view, the rolling contours that seem to be God’s work but are actually the product of shovels or bulldozers, the carefully managed tricks of perspective that make you think you are closer to the putting green than in fact you are, the open axial views to the far horizon (“prospects,” in the language of landscape), or the water feature so placed that it reflects a copper beech against the sky. Even the ha-ha is here, put into service as a hazard that lurks invisibly until you discover it has engulfed your shot. Some golf courses feature actual deer, foxes, or rabbits. I’m talking about the typical inland course, not the “linksland” courses made mostly of sand dunes, which are common in Britain but rare in the U.S.

Golf is not a good walk spoiled. A walk in the country is merely a spectator sport. The viewer is not involved in the scene. But a golfer, like a farmer or a hunter, is deeply engaged with the landscape. And golf is spatial. Your architectural skills come into play. You’re always figuring distances, angles, slopes, textures, winds, maybe the grain of the grass (meaning the direction it’s pointing, which may follow the sun). You’re a kind of land surveyor. If you’re a pro, you will even want to know what variety of grass was planted to surface the greens. You’re alive with all your senses to landscape in all its aspects. Landscape isn’t just there, it matters.
Never the same shot

Golf is also like architecture in that there are no cookie-cutter plans, or at least no good ones. Unlike bowling or tennis, golf is played on a surface in which every course, every fairway, every green is different. In a lifetime, you never play exactly the same shot twice. Isn’t that part of what makes the practice of architecture, too, so fascinating?

Mark Twain should have tried golf. He might have come up with something to rival John Updike’s marvelous short story “Farrell’s Caddie,” in which a wizened caddie steers a callow American golfer around a Scots course. Updike describes the caddies as “hunched little men in billed tweed caps and rubberized rain suits, huddled in the misty gloom,” which may not sound much like your desk critics in design school, but Sandy the caddie coaches his American visitor with a similar mix of encouragement, challenge, and collaboration. Eventually, writes Updike, “Farrell and his caddie began to grow into one another, as a foot in damp weather grows into a shoe.”

I’m no landscape historian, so I consulted some experts as to whether my instinct is right about the similarity between the American golf course and the English country garden of Capability Brown. Betsy Rogers is the founder of the Central Park Conservancy, and her book, Landscape Design: A Cultural and Architectural History, is the only one I know of that deals with golf. On the phone, she gives me a “Yes, but.” Says Betsy: “They’re both designed landscapes, they’re both recreational, and they both go back to the 18th century in the British isles.” She sees the resemblance, but she says golf courses were and are usually designed by golf pros and specialists, and she can’t document any direct influence.

I try Doug Reed of the Boston landscape firm Reed, Hilderbrand, who says, “It sounds so right and believable to me, but I don’t know of any literature on it.”

I phone Peter Schaudt of Hoerr Schaudt landscape architects in Chicago, and here I finally hit a kind of jackpot. Schaudt first says, “I would guess there’s a genuine correlation,” and he then speculates that early golf courses were sometimes converted from private estates, the former garden being directly transformed into the future golf course. Then he begins talking about the late Dan Kiley, the great landscape architect, for whom Schaudt once worked.

Kiley, says Schaudt, was a golf nut who hated Capability Brown and forbade the name from being mentioned in the office. “He thought Brown’s work was a profanity,” says Schaudt. “He thought he ruined many good landscapes.” What were the landscapes he ruined? They were the axial, gridded, geometric parks we associate with continental Europe, the opposite of Brown’s more free-form, more romantic, let’s-pretend-it’s-natural spaces.

“Dan always wanted to design a Le Notre golf course,” says Schaudt, referring to the French designer of the formal gardens at Vaux-le-Vicomte and Versailles. “It would have had a symmetrical, axial plan. When Dan played, he always hit straight short axial shots, and he always beat us younger guys who were hitting longer balls but spraying them all over the course.”

I rest my case. If Dan Kiley despised Capability Brown, and if he wanted golf courses to look more like Le Notre, then he’s at least implying that actual courses are too Brownian.

Dan Kiley was very much a Modernist, of course, not a product of the French Baroque. But like so many classical Modernists, he was in love with grids and geometric rigor. You have to wonder whether anyone has ever attempted a Modernist golf course. What would one look like? Or is the American golf course so deeply imbedded in the mythos of the Romantic movement that any change would be impossible?

Robert Campbell is the Pulitzer Prize–winning architecture critic of The Boston Globe and author (with Peter Vanderwarker) of Cityscapes of Boston.

sábado, 24 de outubro de 2009

Companheiro Iscariotes

Dora Kramer

O presidente Luiz Inácio da Silva pode ser, e é, um político ardiloso. Mas não é um homem corajoso. Tampouco é um líder renovador. Não bate de frente com ninguém que possa vir a lhe ser útil amanhã, não enfrenta questões polêmicas, não compra brigas difíceis nem aceita disputa com igualdade de condições, só entra em conflitos protegido por escudos e, sobretudo, não confronta paradigmas.

Na dúvida, prefere a rendição. E pior, na condição de chefe da Nação, não hesita em classificar o Brasil como um país fadado a fazer política ao rés do chão e de mãos sujas.

Na entrevista publicada na Folha de S. Paulo de quinta-feira, Lula pretendeu demonstrar pragmatismo, mas o que exibiu mesmo foi um imenso conformismo, incurável conservadorismo e oceânica indiferença em relação a qualquer coisa que não tenha a ver com sua pessoa.

"No Brasil, Jesus teria que se aliar a Judas", disse, como justificativa à sua tolerância para com a ausência de limites entre o público e o privado na operação da política brasileira.

Não é a primeira vez que o presidente se põe no patamar de divindade nem é inédita a manifestação de complacência em relação às piores práticas e seus praticantes. O exemplo, porém, agora foi mais infeliz do que nunca.

Desrespeitoso do ponto de vista religioso - ainda mais para quem preside a maior nação cristã do mundo - e ignorante do que tange ao registro histórico. Jesus, bem lembrou o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, d. Dimas Lara Barbosa, não se aliou aos fariseus e penou exatamente por se manter fiel aos seus princípios.

Não se imagina que um político, nem mesmo um presidente da República, possa se conduzir por parâmetros santificados. Daí não ser aceitável também que dê ares sagrados aos seus atos.

Contudo, espera-se de lideranças políticas - principalmente daquelas detentoras da admiração popular e que tenham feito carreira apresentando-se como arautos da mudança - que não se acomodem. Não compactuem, que usem seus melhores atributos para melhorar os defeitos que os fizeram crescer no imaginário da população como a materialização do bem contra o mal.

Em Lula, a figura do progressista, um mito alimentado por duas décadas de ofício oposicionista, não resistiu ao poder. Bem como o símbolo da luta em prol da depuração dos costumes e defesa da ética mostrou seus pés de barro ao adentrar o Palácio do Planalto.

Antes de se especializar como comandante das tropas do mau combate, sempre se alinhando às piores causas, jamais vocalizando os melhores valores, Lula abandonou as reformas.

Algumas delas apresentou pro forma ao Congresso, como a tributária, a política, a previdenciária, mas ou não lutou por elas ou as deixou pelo meio do caminho. Outras, como a trabalhista e a sindical, simplesmente ignorou. Para não arbitrar conflitos e, assim, correr o risco de se confrontar com setores que lhe poderiam ser úteis.

Lula não é um homem que tome posições e brigue por elas. Não gosta de perder. Talvez considere que já tenha dado ao País sua cota nas três derrotas eleitorais antes de conseguir se eleger presidente. Uma vez conquistado o poder, usa seus instrumentos como um fim em si mesmo.

Ao longo de dois mandatos quase completos, o presidente Lula em nenhum momento sequer sinalizou disposição de empregar suas energias para ajudar a política brasileira a se modernizar. Ao contrário, valeu-se do atraso e apostou em seu aprofundamento.

Ao ponto de, na mesma entrevista, ter atribuído ao presidente do Senado, José Sarney, alguém a quem não hesitava ofender chamando de "ladrão" quando atuava como oposicionista, a condição de guardião da "segurança institucional" do Brasil.

Segundo ele, sustentou Sarney no cargo, a despeito de denúncias e mentiras confessadas, porque representava uma "garantia" ao Estado brasileiro. Não, significava uma caução para o controle do Executivo sobre o Senado, como admite na frase seguinte. A oposição, afirmou o presidente, faria "um inferno" no País, caso Sarney fosse afastado dando lugar ao vice, Marconi Perillo, cujo grande defeito foi ter dito de público que havia alertado Lula sobre a existência do mensalão no Congresso.

"Não entendi por que os mesmos que elegeram Sarney um mês depois queriam derrubá-lo", declarou, fingindo-se de ingênuo, pois não faltaram fatos para propiciar a sua excelência perfeito entendimento a respeito da situação, perfeitamente compreendida pela bancada de seu partido no Senado.

O presidente, que outro dia mesmo reclamava dos políticos de "duas caras", de novo encarnou a simbologia do mau exemplo. Convalidou, pela enésima vez, as práticas nefastas que passou a vida dizendo que precisavam ser combatidas.

Isso é pior do que ter duas caras: é jogar no lixo uma trajetória, enterrar uma biografia, é trair uma legião de brasileiros que o elegeu acreditando nas promessas de mudança.